Conceder financiamento a juros
baixos e sem cobrança de garantia, para pessoas de baixa ou nenhuma
renda, é o objetivo da parceria firmada entre o Governo do Pará e o
Grameen Bank, conhecido como “Banco dos Pobres”. A estratégia de
enfrentamento da pobreza no Estado, que aproveitará o know-how de mais
de 30 anos da instituição financeira, será implantada primeiramente no
Arquipélago do Marajó, que tem os mais baixos índices de desenvolvimento
humano (IDH) do Estado.
A parceria com o governo do Pará será efetivada por meio do Banco do
Estado do Pará (Banpará), com a intermediação do professor Huzzatul
Islan Latifee, diretor presidente do Grameen Bank, que está no Pará
fazendo uma visita técnica a alguns municípios do Marajó.
Na próxima segunda-feira (18), o grupo começará as reuniões de trabalho
para traçar o perfil da linha de microcrédito que será oferecida no
Estado. O professor Latifee também terá uma audiência com o governador
do Estado em exercício, Helenilson Pontes, na próxima semana.
O Grameen Bank foi criado em Bangladesh, na Ásia, pelo economista
bengalês Muhammad Yunus, como um banco de microcrédito destinado a
beneficiar famílias da aldeia de Jobra. A iniciativa foi agraciada, em
2006, com o Prêmio Nobel da Paz.
Pro Paz
- A visita do professor Latifee é intermediada pelo programa Pro Paz, e
começou na última terça-feira (12) pelos municípios de Soure e
Salvaterra, e terminará no domingo (17). Ele passará ainda pelos
municípios de Cachoeira do Arari, Breves, Curralinho, Muaná, Ponta de
Pedras e Melgaço.
Também integram a
comitiva o gerente de Área do Pro Paz, Jorge Bittencourt; o diretor de
Microcrédito do Banpará, Mauro Palheta, e a gestora do projeto
Território da Cidadania, do Sebrae (Serviço Brasileiro de Apoio às Micro
e Pequenas Empresas), Jaqueline Diniz.
Ao final da visita será feito um relatório do cenário de negócios
sociais no Marajó, para a definição da estrutura final do formato do
financiamento de microcrédito, com base em um modelo que beneficie a
parcela da população que está na linha da pobreza.
O professor Latifee explicou que, para o desenvolvimento do programa,
devem ser consideradas a densidade populacional da região, a cultura
local e a estrutura legal.
Ele destacou a
importância da iniciativa do Governo do Pará em procurar formas de
combater a pobreza no Estado, e ressaltou que, com compromisso forte e
apoio das autoridades, é possível desenvolver um programa aos moldes do
que foi criado em Bangladesh.
“É um bom
sinal essa iniciativa do Governo do Estado. O apoio a esse processo é
muito importante para o sucesso do programa. Nós sabemos que é possível
desenvolver a sociedade investindo em negócios das pessoas mais pobres.
Esse programa de microcrédito é diferente de tudo o que as empresas
financeiras praticam no mercado, e nossa experiência diz que dá certo, e
tenho certeza que aqui também será possível trabalhar esse formato”,
afirmou o professor Huzzatul Islan Latifee.
Recursos
- O desenvolvimento de negócios sociais é uma das estratégias adotadas
para promover o desenvolvimento econômico e social dos 16 municípios do
Arquipélago do Marajó.
Segundo Jorge
Bittencourt, o governo do Estado dispõe de R$ 10 milhões para investir
em pequenos negócios nos municípios marajoaras, desenvolvendo projetos
já existentes e incentivando a criação de novas iniciativas nas
comunidades.
“Estamos trabalhando na
lógica de desenvolvimento de negócios sociais para o combate e
enfrentamento à pobreza no Marajó. Já temos recursos para isso, mas
precisamos saber de que maneira investir esse crédito, para que as
pessoas mais pobres possam usufruir desse benefício e desenvolver a
comunidade em que vivem. Por isso, a experiência do Grameen Bank é
fundamental nesse processo, e a gente espera que ao final dessas visitas
se consolide uma estrutura de financiamento sólida e duradoura, que
possa ser aplicada em nosso Estado”, afirmou Jorge Bittencourt.
Para Mauro Palheta, do Banpará, o principal aprendizado com o modelo de
microcrédito criado pelo Grameen Bank é cultural, já que o programa
propõe uma mudança de comportamento, tanto para a instituição financeira
quanto para quem recebe o financiamento.
“A maioria das cooperativas, por exemplo, é instruída a tomar créditos
bancários, mas a maioria não sabe exatamente como fazê-lo e nem como
manter a estrutura lucrativa, para poder honrar seus compromissos. A
orientação técnica é fundamental nesses casos, e nós, enquanto banco,
temos que instruir na cultura de conceder crédito, e não dar
investimentos, ajudando no desenvolvimento da capacidade empreendedora
dessas pessoas”, declarou Mauro Palheta.
Visitas
- Em Soure, no primeiro dia de reconhecimento dos potenciais de
desenvolvimento, o professor Latifee visitou duas queijarias, uma
indústria de derivados de coco e dois pontos de artesanato, que utilizam
couro e cerâmica.
Na microempresa
Laticínios Mironga, o professor conheceu o sistema de preparação do
queijo do Marajó, e toda a cadeia produtiva existente em torno do
rebanho de búfalos do arquipélago. A fábrica, que pode beneficiar até
mil litros de leite por dia, trabalha, em média, com 300 litros/dia.
Segundo o proprietário do “Laticínios Mironga”, Carlos Augusto Nunes, o
búfalo é um instrumento de inclusão social no Marajó, onde as famílias
podem ter uma boa qualidade de vida gerada com o fornecimento de leite, e
utilizar a tração animal na manutenção de plantações. O búfalo,
acrescentou, além de ser uma fonte de renda, é um atrativo para crianças
e adolescentes que aprendem, desde cedo, a manejar o animal, e ver isso
como um trabalho futuro.
“Nós tínhamos
no Marajó um projeto chamado Cavalgar, que ensinava às crianças as
práticas com os búfalos, no horário depois das aulas. Como resultado,
tínhamos crianças mais confiantes, saudáveis e com melhor rendimento
escolar. Por isso, acredito que investir nas famílias para que elas
trabalhem com o búfalo é resultado garantido. O que falta são recursos
para que as famílias possam adquirir o gado leiteiro, e abastecer as
queijarias”, afirmou Carlos Augusto Nunes.
No “Laticínios Mironga” é a experiência da queijaria que pode motivar
projetos futuros, tanto na produção de queijo quanto no desenvolvimento
da cadeia produtiva. A criação de búfalos no Marajó é constantemente
compartilhada com o cultivo de frutas e plantas medicinais.
Outra forte tendência de negócios em Soure é o artesanato local, que
pode desenvolver uma cadeia abrangendo o fornecedor de matéria prima,
passando pelos artesãos e pela venda dos produtos.
Couro de peixe
- Experiências como a desenvolvida pela Cooperativa Mista Agrícola e
Agroindustrial de Salvaterra (Comaas), na comunidade Caldeirão, que
beneficia a pele de peixe para confecção de calçados e bolsas, além de
outros resíduos do pescado para fabricação de ração e adubo, são
exemplos de como a iniciativa da comunidade pode gerar renda e ainda
ajudar o meio ambiente, aliando dois preceitos importantes nos negócios
sociais.
A cooperativa recicla cerca de
três toneladas de resíduos de pescado de uma fábrica de beneficiamento
de peixe. O lixo orgânico, que seria descartado, é transformado em
produtos de consumo 100% biodegradáveis.
“A cooperativa foi criada com recursos próprios e cresceu com a
dedicação e trabalho dos cooperados. Com uma linha de financiamento que a
gente pode pagar, conseguiríamos expandir nossos negócios, aumentar
nossa renda e ampliar a rede de cooperados. Já beneficiamos a pele do
peixe e gostaríamos de produzir sapatos e bolsas, que atualmente são
fabricados por uma terceirizada”, informou Gabriel Mendes, presidente da
Comaas.
Uma cooperativa de extração de
óleo de andiroba e de coleta de sementes, como murumuru, pracaxi e
tucumã, localizada na vila de Joanes, também foi visitada pela comitiva.
Nesta quarta-feira (13), a comitiva esteve no município de Cachoeira do
Arari, e começou a visita técnica pelo Museu do Marajó. O professor
Latifee conheceu ainda o trabalho de costureiras e bordadeiras, que se
uniram em cooperativa por meio do Museu do Marajó. Ele fez questão de
incentivar o trabalho das mulheres e a ampliação dos negócios. O mesmo
aconteceu na cooperativa Ecorecicle, voltada à coleta e venda de
material reciclável.
O cooperado Arilson Dias, 22 anos e pai de duas crianças, explicou como
funciona a rede de cooperados, e frisou a expectativa com o futuro da
cooperativa. Um dos pontos enfatizados foi que a cooperativa deve se ver
como um empreendimento, um negócio, para que se organize como tal e
dependa, cada vez menos, de ajudas externas.
“Essa conversa foi muito boa. Tenho certeza que se a gente se organizar
melhor vai conseguir tornar a nossa cooperativa em uma empresa grande e
lucrativa”, concluiu Adilson Dias. À tarde, a comitiva partiu para o
município de Breves.
(Agência Pará)
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